Quando o Feriado Fala de Fé… e os Games Também

O feriado de Corpus Christi carrega consigo a imagem do sagrado. Ruas decoradas com tapetes coloridos, procissões silenciosas, e um convite coletivo à reflexão sobre fé, sacrifício e transcendência. Mas será que esses temas vivem apenas nas igrejas? E se um dos jogos mais sombrios da história recente dos videogames também fosse, na essência, um ritual de fé? Dark Souls não é apenas um RPG difícil. Ele é uma experiência quase litúrgica. Um universo em ruínas onde a esperança é uma brasa morrendo, e o jogador, um peregrino condenado a repetir eternamente um ciclo de dor, morte e renascimento. Parece familiar? Neste Corpus Christi, vale a pena enxergar Lordran não só como um mundo de espadas e monstros, mas como um espelho sombrio das próprias perguntas que movem o espírito humano.

A Chama como Sinal Divino

A “Chama Primordial” é o coração simbólico de Dark Souls. Ela é o fogo criador, o elo entre os vivos e os mortos, a luz que sustenta a existência. Mas, à medida que ela se apaga, os deuses tremem, e os homens enlouquecem. Essa chama evoca a eucaristia, não literalmente, mas espiritualmente: é algo que precisa ser mantido vivo, compartilhado, renovado por um sacrifício — o seu. No fim, você é convidado a decidir: manter a chama viva em nome do mundo, ou deixá-la apagar e abraçar a escuridão. Fé ou ceticismo. Dogma ou liberdade.

Um Mundo de Pecado, Queda e Redenção

Em Dark Souls, cada personagem vive uma penitência. Cavaleiros que perderam o rumo, clérigos corrompidos pela arrogância, reis que quiseram ser deuses. É um mundo onde todos caíram — e você caminha entre os escombros dessas falhas morais. Esse é o mesmo princípio da queda humana, central em tantas tradições religiosas: o orgulho, a desobediência, o erro — e a tentativa dolorosa de redenção. A jornada do “Escolhido dos Mortos-Vivos” não é diferente da de um penitente. Cada chefe vencido, cada alma sacrificada, cada fogueira acesa… tudo é parte de uma peregrinação por um sentido maior.

Dark Souls III – Opening Cinematic Trailer | PS4, XB1, PC

Fé sem Palavras, Rituais sem Promessas

Dark Souls não te dá respostas fáceis. Não há profetas. Não há salmos. Só fragmentos. Você precisa reconstruir o mundo — e sua fé — com pedaços soltos, como quem tenta compreender o divino através de relíquias partidas. Esse silêncio é poderoso. Ele nos obriga a pensar: o que nos move? Por que insistimos em tentar, mesmo sabendo que vamos cair de novo?

Jogar Como Um Ato de Fé

No fim, jogar Dark Souls no feriado de Corpus Christi pode ser mais simbólico do que parece. Você assume o papel de alguém que, mesmo amaldiçoado, continua. Que sofre, mas resiste. Que cai, mas volta. E talvez seja isso que a fé significa para muitos: continuar mesmo quando tudo parece perdido. A chama pode vacilar, mas você está ali, com sua espada embainhada, olhando para a próxima fogueira.

Conclusão: Lordran Também é um Lugar Sagrado

O feriado de Corpus Christi não precisa ser apenas sobre tradição — pode ser sobre introspecção. E nesse silêncio entre um chefe e outro, entre uma morte e outra, talvez você encontre o que muitos encontram nas igrejas: a chance de se reencontrar consigo mesmo.